quarta-feira, 27 de junho de 2012

Bodhitcharyavatara

CAMINHO PARA A ILUMINAÇÃO
GUIA PARA O MODO DE VIDA DO BODHISATTVA
Shantideva



coletivamente conhecido como lojong, ou "treinamento da mente". É uma categoria de
textos religiosos que tratam basicamente de duas preocupações fundamentais da obra
de Shantideva, o cultivo da mente altruísta do despertar e a geração de uma profunda
percepção sobre a natureza da realidade. A estrofe seguinte está agora quase
imortalizada por causa das reiteradas declarações do Dalai Lama que é a maior fonte de
sua inspiração: "Por tanto tempo quanto o espaço durar e por tanto tempo quanto os
seres vivos existirem, que eu possa até lá também esperar para dissipar a miséria do
mundo."
[Adaptado de A Arte de Lidar coma Raiva: O Poder da Paciência. Sua Santidade o Dalai Lama, tradução de
A. B. Pinheiro de Lemos, a partir da tradução para o inglês do Geshe Thubten Jinpa. Rio de Janeiro:
Campus, 2001. Pág. 15-17.]
preguiçoso a quem chamavam Bhusuku ("o que só sabe comer, dormir e defecar").
Todos achavam imoral alimentar esse "parasita" com as oferendas dos fiéis e decidiram
fazer tudo se livrar dele.
Tendo-se posto de acordo, os monges proclamaram que cada um por sua vez devia
pregar o Dharma. Pensavam assim que, para evitar ser humilhado, Bhusuku fugiria. Mas
não só isso não aconteceu como, apesar da insistência dos seus colegas impacientes
para o ridicularizar, ele recusou-se a pregar, argumentando a sua ignorância. O caso foi
levado ao abade, que decidiu que o monge recalcitrante se submetesse à regra.
No grande átrio do templo prepararam então um trono inusitadamente alto,
dispuseram um altar com numerosas oferendas e convocou-se a assembléia completa
dos monges.
À hora prevista convidaram o "parolo" para se sentar. De repente, sem que ninguém se
desse conta de como, Shantideva estava sentado em cima desse trono desmesurado.
Alguns começaram a se sentir pouco à vontade. Shantideva perguntou, "Devo comentar um texto conhecido ou devo dar um ensinamento inédito?" Os panditas olharam-se, surpreendidos e trocistas, e responderam, "A vossa aptidão a dormir e as vossas outras maneiras são realmente extraordinárias; o melhor é manter essa tradição específica. Improvisai-nos um discurso." Então, Shantideva expôs o Caminho da Iluminação (Bodhicharyavatara), também conhecido como Guia para o Modo de Vida do Bodhisattva (Bodhisattvacharyavatara), menor que o seu Compêndio das Instruções e mais detalhado que o seu Compêndio dos Sutras.Enquanto ensinava, a assistência, estupefata, viu Manjushri majestosamente sentado no céu e concebeu uma grande fé. Quando chegou à estrofe Quando nem a realidade nem a não-realidade deixam de se apresentar à mente, então, na ausência de qualquer outra atitude possível, a mente liberta de conceitos tranqüiliza-se. [Capítulo 9, estrofe 34] Shantideva elevou-se lentamente no céu com Manjushri, cada vez mais alto, até se tornar invisível. No fim do Caminho para a Iluminação, só se ouvia a sua voz. Os panditas, cuja memória tinha a reputação de infalível, imediatamente puseram o seu discurso por escrito, mas uns encontraram-se com setecentas estrofes, outros com mil e outros com mais ainda. A versão dos panditas de Kashmir tinha nove capítulos e setecentas estrofes, a versão dos panditas de Magadha tinha dez capítulos e mil
estrofes. No seu discurso (capítulo 5, estrofes 105-106), Shantideva tinha dito que
lessem continuamente o Compêndio das Instruções ou então que se estudasse, como
abreviado, o Compêndio dos Sutras. Ambos os textos eram desconhecidos de todos. Dois panditas de memória infalível decidiram procurar Shantideva. Depois de muitas buscas encontraram-no no sul da
Índia, meditando junto a um relicário (stupa). Explicaram-lhe então longamente as
VI
razões da sua visita. Shantideva disse-lhes que a versão autêntica era a dos panditas de Magadha e que os dois compêndios estavam em Nalanda, nas traves do telhado da sua cela. Encantados, voltaram a Nalanda e encontraram no lugar indicado os dois manuscritos, escritos na fina caligrafia dos panditas. De novo voltaram para junto de Shantideva, que lhes explicou o sentido desses textos. A existência extraordinária de Shantideva progrediu sempre. Percorreu a Índia realizando milagres, salvou milhares de pessoas da fome multiplicando o alimento, curou doentes e feridos, deu fé aos incrédulos e viveu como um perfeito Bodhisattva. [Adaptado de O Caminho para a Iluminação — Bodhicaryavatara. Coleção Espiritualidades, série Budismo, sob a direção do Ogyen Kunzang Chöling. Escrito por Shantideva, tradução para o português por Filipe Valente Rocha e outros praticantes da escola do Budismo tibetano Ogyen Kunzang Chöling. Lisboa: Livros
e Leituras, 1998. Pág. 51-57. O texto foi gentilmente transcrito por Sherab Chötso.]