INTRODUÇÃO AO BUDISMO
Uma visão da doutrina budista através dos textosEste é um trabalho de seleção e ordenação de textos
de vários autores e mestres budistas por
Karma Tenpa Darghye.
Qualitativamente,
cada uma das seis aflições mentais engendra um certo tipo de
nascimento: o ódio conduz a um reino infernal, a ganância a um reino de
fantasmas famintos, a estupidez a um reino animal, o apego desejoso a
uma condição humana, a inveja ao reino dos deuses invejosos, e o orgulho
aos estados divinos.
Quantitativamente, estes diferentes estados resultam da acumulação de karma.
Então, muito karma negativo gera um reino infernal; um karma um pouco menos negativo, o reino dos fantasmas famintos; um pouco menos que isso, um reino animal.
Geralmente, quando o karma positivo
está misturado com alguns aspectos negativos, nascemos em um dos três
reinos superiores da existência, de acordo com as respectivas forças
destes karmas.
O Reino do Inferno
A mente dominada pela raiva e pelo ódio produz o karma
para a vida em um inferno. O que sofre nesse estado infernal é a mente,
nossa mente. As aparências infernais, os seres que nos atacam ou nos
matam, o ambiente e todo o sofrimento que nos aflige nesse reino, são
produções de nossa própria mente condicionada pelo nosso karma.
Nestes
estados infernais, somos atormentados inflexivelmente por um sofrimento
inconcebível: somos mortos e, em alguns reinos infernais,
experienciamos ser mortos de novo e de novo; somos torturados pelo calor
e frio extremos. E não há liberdade, nem qualquer possibilidade de nos
dedicarmos à prática espiritual.
O Reino dos Fantasmas Famintos
Se nossas mentes caírem como pressas da ganância ou cobiça, o karma que
resulta é o nascimento como um fantasma faminto. Neste estado, nunca
podemos obter o que queremos, nem podemos desfrutar da comida ou bebida
que desejamos desesperadamente como fantasmas famintos. Sempre estamos
precisando e procurando algo, mas somos completamente incapazes de
satisfazer nossos desejos e sofremos de fome, de sede e de constantes
frustrações intensas. É também um estado produzido pela nossa própria
mente e, apesar de ser um pouco menos desfavorável que o reino infernal,
ainda é um estado miserável.
O Reino Animal
A
mente também pode cair sob a influência da cegueira, da estagnação
mental e da estupidez, o que causa o nascimento como um animal. Há
muitas espécies animais: animais selvagens, animais domésticos e assim
por diante. Todos eles experienciam diferentes formas de sofrimento,
tais como ser comido vivo, brigar uns com os outros, ou ser subserviente
e abusado. Todo sofrimento encontrado no reino animal também é a
produção da mente e a manifestação de karma resultante de ações negativas anteriores.
Estes três tipos de existência compõem os estados dos reinos inferiores.
Entre
eles, o mais favorável é o reino animal. Mas mesmo nesse estado, é
muito difícil despertar o amor e a compaixão, e é impossível praticar o Dharma.
Em todos estes reinos inferiores, não há a possibilidade de praticar o Dharma
e de atingir a realização; a mente está constantemente perturbada pela
raiva, ódio, desejo e assim por diante. Além disso, os seres dos reinos
inferiores tendem a realizar mais ações negativas que criam ainda mais karma
doloroso. Deste modo, eles perpetuam o condicionamento das vidas nos
reinos inferiores que, além disso, duram por um tempo extremamente
longo.
O Reino Humano
A
condição humana é a primeira das existências nos reinos superiores. Os
humanos são praticamente os únicos seres dotados com as condições
necessárias para o progresso espiritual, assim com as faculdades que
permitem a prática e a compreensão do Dharma. Porém, ser humano
não garante o progresso espiritual. O valor da vida humana é variável e
apenas aqueles que obtiveram a chamada "preciosa existência humana"
podem praticar o Dharma; eles são tão raros quanto estrelas
durante o dia! Apesar desta ser uma condição menos dolorosa que as
existências nos reinos inferiores, a condição humana ainda tem muitos
tipos de sofrimento, sendo que os quatro tipos principais são o
nascimento, a doença, a velhice e a morte. Além destas quatro grandes
fontes de sofrimento, os humanos sofrem quando são separados daqueles
que amam muito, durante suas vidas ou na morte, ou quanto têm de lidar
com pessoas com as quais não querem lidar ou que são hostis diante
deles. Os humanos sofrem ao perder suas posses, ao não serem capazes de
manter o que planejaram adquirir e ao não serem capazes de obter o que
querem.
O Reino dos Deuses Invejosos
O karma
que é acima de tudo positivo, porém misturado com a inveja, causa o
nascimento no reino dos deuses invejosos. Este é um estado feliz, dotado
com muitos poderes e prazeres mas, por causa da força da inveja, há
constantes brigas e conflitos. Os deuses invejosos opõem-se aos deuses
que são seus superiores e brigam entre si mesmos.
O Reino Divino
O karma positivo combinado com pouquíssimo karma negativo resulta em um renascimento nos estados divinos. Há diferentes níveis de existência divina.
Os
primeiros são os estados divinos do reino do desejo, assim chamados
porque a mente nesses reinos ainda está sujeita aos desejos e ao apego.
Estes
deuses têm uma vida extremamente longa: em um dos primeiros reinos dos
deuses, um dia dura o equivalente a cem anos humanos, e eles vivem
quinhentos dos anos deles. No nível seguinte dos reinos divinos, cem de
nossos anos equivalem a um dos dias deles, e eles vivem mil anos! Nestes
reinos geralmente felizes, ainda há algum sofrimento, causado por
ocasionais brigas com os seres do reino dos deuses invejosos.
As
existências no reino do desejo vão desde os reinos mais miseráveis – os
reinos infernais - até os primeiros reinos dos deuses; todos estes
estados estão sob o controle do desejo.
Além do
reino do desejo, há o reino da forma sutil, que inclui uma hierarquia de
dezessete níveis divinos sucessivos. Os seres nestes estados têm uma
forma sutil e corpos extremamente grandes, luminosos; suas mentes
conhecem poucas paixões, poucos pensamentos; e eles desfrutam de uma
felicidade incrível. A paixão predominante é o orgulho sutil - os seres
destes reinos acham que atingiram algo superior e vivem um tipo de
auto-satisfação.
Estes estados do reino da forma
correspondem aos quatro níveis de concentração meditativa,
caracterizados pela transcendência progressiva da investigação, da
análise, da alegria e do êxtase.
Finalmente, além
até mesmo deste quatro níveis de concentração do reino da forma, pode
haver o nascimento no reino sem forma. Os seres do reino sem forma não
experienciam qualquer sofrimento severo e virtualmente não têm quaisquer
paixões; eles permanecem apenas em uma forma extremamente sutil. A
impureza que permanece em suas mentes é um tipo de estagnação mental que
impede a realização da natureza última da mente. No reino sem forma, a
mente tem acesso a quatro estados sucessivos de consciência; absorção do
espaço infinito, absorção da consciência infinita, absorção do nada, e
absorção nem da diferenciação nem da não-diferenciação.
Os
deuses do reino sem forma têm o sentimento de possuir um corpo, mas
este corpo é imperceptível. Eles têm apenas o quinto agregado da
individualidade - a consciência - ainda presente como uma ignorância
sutil que lhes dá um sentimento de existir neste corpo sem forma. Esta
consciência finalmente age como uma mãe que novamente dá a luz aos
outros agregados.
Deste modo, os deuses do reino sem forma retornam aos reinos inferiores.
Para ser livre do samsara, a consciência em si deve ser definitivamente transformada na sabedoria primordial, a sabedoria da iluminação.
Estes
oito estados dos reinos da forma e sem forma pertencem a uma mente
positiva, não-distraída; seus estágios sucessivos são progressivamente
livres do apego. Todos estes estados dos seis reinos do samsara são transitórios e condicionados: todos eles são parte da roda do samsara.
Apesar
de os deuses dos reinos da forma e sem forma terem poucas formas
severas de sofrimento, eles ainda estão sujeitos à morte e à
transmigração.
Eles não têm o poder de permanecer em sua condição divina e sofrem, tendo de renascer em um reino inferior.
Se
acharmos difícil aceitar a noção destes diferentes reinos, vamos
simplesmente lembrar que a experiência de cada um é a sua realidade.
Quando estamos sonhando, nossos sonhos tornam-se a nossa realidade, e
acontece o mesmo com os seis reinos. Por exemplo, água pode ser
experienciada de maneiras muito diferentes: para os seres do inferno,
ela causa tortura; para os fantasmas famintos, é o que desejam
desesperadamente; para alguns animais, é o meio necessário para a vida;
para as pessoas, é uma bebida; para os deuses invejosos, é uma arma; e
para os deuses, é um néctar sublime.
As
profundezas do oceano são o habitat natural dos peixes, mas os humanos
não podem viver lá. Os pássaros voam no céu, mas isto é impossível para o
corpo humano. As pessoas que são cegas não podem ir aonde querem,
enquanto aqueles que têm a visão normal podem se mover livremente por
aí. Cada um vive em seu próprio mundo ou reino, sem perceber o dos
outros.
Então, o samsara é composto por
três reinos: o reino do desejo, o reino da forma e o reino sem forma.
Todas as possibilidades da existência condicionada estão incluídas
neles.
Tornando-nos conscientes de que todos os
seres sofrem neste ciclo de existência, nos inspiraremos a nos
liberarmos da ignorância e da delusão onde estamos imersos, a nos
libertarmos do samsara, que é um oceano de sofrimento, e a nos esforçarmos para atingir a felicidade suprema do estado búddhico perfeito.
No
passado, tivemos incontáveis nascimentos na existência cíclica. Hoje,
somos seres humanos; se usarmos este oportunidade sabiamente, poderá ser
o ponto de partida para a nossa liberação.
Luminous Mind - Kalu Rinpoche