domingo, 14 de junho de 2009

Chico Rei


UM DIA NO CHICO REI



Numa quinta feira, como toda semana, estava eu dando aula de cerâmica aos adolescentes, no Instituto Chico Rei, na qual eu faço trabalho.

São crianças e adolescentes em situação de risco. Maioria problemática.

Uma adolescente q costuma sempre dar muito trabalho, de uns tempos pra cá começou a me dizer coisa do tipo “Dona”, tudo mundo me chama de Dona:

-“casa comigo”?

-”Nois casa junto”?

Eu impassível, não levei a sério e continuei a dar aula.

-Dona você tem namorado?”

-Tenho (mentira)

-Como chama?

-Fulano

A garota que estava a me rodear, num dado momento apertou o meu seio!

Fiquei congelada. Pensei, “E agora, o q eu faço?”

Fingi que não aconteceu ABSOLUTAMENTE NADA! E continuei a aula.

Fim da aula, com ar absolutamente tranqüila me dirigi a Psicóloga e relatei o caso.

É apenas um dia como os outros no Chico Rei.


Regina Rieko Kishi

4 comentários:

Betto Enso disse...

Quando pensamos em Comunidade carente nos vem a mente: carente financeiramente; esquecemos que a carencia é muito mais ampla: de valores, de educação, de limites, de consciencia, de percepção, carencia emocional.

A cerâmica é feita através do toque e alguem que é carente de toques pode confundir as coisas.
Vc foi invadida em seu espaço vital, mas seu silencio na ocasião foi oportuno. Não se sabe se na inconsciencia do outro ser, aquele ato foi intencionalmente uma agressão, uma curiosidade ou tentativa de contato e carinho.
Uma falta de mãe, talvez... não se sabe.

Me lembrou 2 história q escutei do Villasboas, sobre indios:

- uma mãe fazia cerâmica, pintava, deixava ao lado. vinha o filho pequeno e quebrava.
Ela fazia outra, com uma pintura cuidadosamente elaborada. Ele vinha e quebrava.
Uma certa altura, Villasboas chegou e perguntou:
- Vc não liga dele quebrar?
- Ah... ele quer quebrar.
- Mas se vc sabe que ele vai quebrar, porque pinta com tanto cuidado?
- Oras, ele quer quebrar uma cerâmica pronta!

Outra, que ele contava:
O homem é o dono da caça, a mulher é dona da casa, artesanato e do alimento, o idoso é dono da cultura e das histórias, e as crianças... bem, elas são donas de tudo! rss..
bjo

Regina Rieko Kishi disse...

É Enso, carencia em tudo.
Emocional, carinho, amor, estrutura, toque. Com certeza ouve confusão na mente dela. Como muitas vezes acontece nessas aulas, de outras formas. Mas vejo, nas palavras, atitudes dela e de outras, a falta de carinho, de afeto, de amor. Não será uma tentativa de socorro?
Os índios criam suas crianças com muita presteza e sabedoria. Pois a criança é dona de TUDO.

bjs

Lilly disse...

Rieko,
Ao ler essa experiência, como psicóloga posso crer que vc e o Betto acertaram em cheio!
Acrescentaria apenas que há a possibilidade dessa adolescente estar sendo agredida em algum grau na sua sexualidade... portanto o pedido de socorro pode surgir repetindo um comportamento do qual ela esteve sendo vítima.
E vc representou para ela a mãe-esposa e carinho.
A cerâmica é de fato um material riquíssimo para trabalhar o toque e a afetividade, expressando o que as pessoas sentem.
Entretanto fico decepcionada com a opinião de pessoas que parecem normatizar o problema, já que ele é comum...
Talvez se essas situações causassem em todos a mesma indignação, transformariamos de fato a carencia e a afetividade de uma forma saudavel.
Continue com essa sensibilidade.
bjo
Eliana

Rieko Kishi disse...

LiLLy, obrigada por postar.
É, vc tem razão no q disse sobre a menina. Considerando-se outras atitudes dela, eu já tinha pensado nessa possibilidade e conversei com a psicóloga a respeito. Diante de impossibilidade de contactar a família fica difícil alguma conclusão. Mas ela está trabalhando c ela. Espero soluções.

bjs
Rieko